Quando o sentimento se desfaz em rotina
Certo dia, uma simples conversa foi o ponto de partida para tal investigação e desse dia pra cá, tenho parado pra ver o que antes apenas olhava, assim como você, a maneira pela qual a felicidade é tratada nos relacionamentos e o quanto há de fantasias para alcançá-la ou mantê-la. Mesmo assim, nossas raízes parecem estar profundas e matam sua sede em poços não muito apropriados. A cultura secular é o poço e sua filosofia é a água que dá de beber sem matar a sede de seus súditos. Até quando continuaremos olhar sem ver tudo isso? Comecemos a ver essa água brotar da terra seca e nos deter em seu percurso para podermos refletir se dessa fonte mina água potável.
Quem sabe você hoje veja e não apenas olhe, porque qualquer olhar é vago sobre o objeto, mas quando não nos detemos em ver, as escamas do delírio interrompem nossa percepção. Olhar sem ver é miopia, é ficar submisso a um ponto perdido, quando há vários pontos a se analisar nas caminhadas da vida, existem muitas pessoas que por não ver estão tropeçando nos abainhados das suas indecisões e até vêem, mas se detém no único ponto a qual lhe foi dado como verdade absoluta. Com isso, gostaria de sua percepção em alguns pontos bem nossos, embora exclusivamente culturais os quais se metamorfoseiam como solução para felicidade e restauração dos corações, mas saiba, você precisa ver e não olhar apenas, então venha e veja.
Depois que vi, passei a escutar melhor, vivo em auto-reflexo, basta uma palavra ao longe e já estou captando o menor sinal e por estar cercado de pessoas todos os dias, passei a escutar e me perguntar o porquê a química dos corpos é o objeto primeiro para análise do outro? O que é essa expressão que recheia a boca dos jovens? “Se não tiver aquela química não dá”. Daí, percebi que em muitos casais existem só química sem sentimento, noutros há sentimento sem química alguma, portanto olhar essas situações sem ver é ficar preso a teorias sem fundamento. A química existe do ponto de vista biológico, mas não deveria ser a razão primeira de análise, e por estar em primeiro plano, muitos não entendem a razão de seus fracassos sentimentais e batizam seus fracassos de rotina e tentam buscar no poço da filosofia secular a solução, mergulhando nesse poço seco de água suja, saindo de suas pseudo-rotinas sem perceber que estão ao sair entrando noutras por estar matando sua sede com uma água que não mata sede, apenas ludibria gerando outras sedes.
Nessa direção, a química dos corpos é objeto de estudos há muitos anos, descobrir o ponto G tem sido até hoje preocupação de muita gente, simplesmente pelo fato de muitos atribuírem a satisfação carnal como objeto de restauração de uma felicidade que nunca se estabeleceu ali, logo o erro está em dar primazia ao corpo sem priorizar o sentimento, nesse caso vejamos:
“De noite busquei em minha cama aquele a quem ama a minha alma; busquei e não o achei. Levantar-me-ei, pois, e rodearei a cidade; pelas ruas e pelas praças buscarei aquele a quem ama a minha alma; busquei-o e não o achei.” (Cantares 3.1,2)
Muitas pessoas vivem nessa eterna busca, passando a beber água em muitas fontes sem matar sua sede, por outro lado quem está disposto a se desprender de seu eu, de seu orgulho para ir buscar nas ruas e praças alguém que ame sua alma? Antes de encontrar é preciso saber que esse mergulho requer paciência e entrega, porque ninguém conseguirá encontrar o que se quer, sem ser aquilo que se pretende ganhar. Esse eterno buscar desemboca no seu eu limitado e se banha em águas límpidas e amadurecidas as quais Deus passa a restaurar por ser você dependente dEle.
Tem muita gente bancando sozinho o super – herói, sem prestar atenção nos conselhos do Criador, só Ele tem água potável pra matar sua sede, seus conselhos, embora paradoxais até hoje, têm restaurado o que se chama de rotina, têm trazido alegrias e real felicidade, quando o maior erro e assinar sem ler, sem ver o que está além dos olhos, é sair pra guerra sem armas, é ensinar sem didática e pior ainda acreditar, mesmo quando os lábios sorriem, em fórmulas milagrosas.
Nessas observações, há muito de veneno didático nessa química, há muitas misturas heterogêneas dificultando de onde vem tal fonte, por certo, sabemos que ficou inevitável não ver tudo isso, mas como todo olhar é vago sobre o mundo, limito-me a dizer: “a ordem dos fatores não alteram o produto”, esse ditado tão nosso explica a ineficácia de toda uma busca para se sair da rotina ou não entrar nela, para muita gente mudar de cenário e de posição, reacenderá o que esfriou, sem perceber que ninguém esfria o que nunca se teve. Não quero com isso dizer que na há turbulências e indiferenças entre os casais, apenas que mesmo nessas turbulências, a alma de um estará buscando o outro que se foi e muitas vezes saímos pelas ruas, praças e recantos da nossa casa e não encontramos, isso faz com que a pressa por uma solução nos lance no poço seco, logo, muitos locam até filmes para tentar sanar um rombo na camada do coração com química, (objetos, roupas específicas, comidas e bebidas estimulantes, lugares pitorescos) quando essa camada se rompeu porque a alma cansou de procurar ou mesmo se descobriu que os sentimentos eram apenas um leve acordo mútuo de um costume pela presença do outro e não um desaguar de um eu e um tu fundido num nós.
Por esse viés, alimentar a ansiedade como fuga da realidade é deixar de ver o óbvio, é não atentar para o caminho, se felicidade dependesse de uma mudança de roupa, de um xarope de marapuama, de mudar de posição ou cenário, não estaríamos vendo tanta insatisfação, traições e separações, portanto precisamos refletir sobre esse estigma filosófico, tirar essas escamas de nossos olhos e passar a depender da vontade de Deus, passando a nos banhar nas águas tranqüilas de sua sabedoria.
Nesse caso, posso afirmar a partir de minhas observações que a rotina em si não existe, apenas gotas de insatisfação as quais já faziam parte do contrato assinado entre ambos, contrato esse que começou infelizmente com um vago olhar sobre o corpo, porque nossa tradição cultural já nos ensina assim, infelizmente muitos pais ensinam assim, quando antes deveriam ensinar aos filhos a ver pequenas minúcias esquecidas hoje: um caráter cristão ao invés de um belo corpo.
Por outro lado, buscar sair da rotina não é só atestar uma insatisfação com o momento, mas também é declarar nossas falhas diante um sentimento cujo caráter cristão esteve sempre em segundo plano। Amor não é a satisfação de corpos e quando passa a ser se enjoa rápido um do outro e por não aceitar cada um suas falhas o relacionamento acaba entrando em conflitos, porque sua base foi construída no prazer físico e não no que disse a Sulamita: “De noite busquei em minha cama aquele a quem ama a minha alma...”. Veja que busca diferente, as águas filosóficas do mundo moderno nos empurra a ir buscar com o corpo, mas um cristão transformado por Deus precisa fazer como a Sulamita deve deitar-se primeiro com a alma, suas vestes e beleza não são os trançados dos cabelos, nem o ouro do pescoço, nem a formosura de seu corpo, mas o caráter interior:
“Sessenta são as rainhas, e oitenta as concubinas, e as virgens sem número. Mas uma é a minha pomba, a minha imaculada, a única de sua mãe e a mais querida daquela que deu a luz; vendo-a, as filhas lhe chamarão bem-aventurada, as rainhas e as concubinas lhe louvarão.” (Cantares 6.8,9)
Quão bom que na hora da escolha a química entre um casal fosse a chama do caráter cristão, um homem e uma mulher sendo louvados pelo testemunho de sua conduta, pela doçura de suas palavras, pela paciência em ouvir o outro, sendo cúmplices nos desertos da vida, um casal que mesmo na envergadura do corpo e nas rugas do rosto se olhassem como adolescentes, se assim fosse, ainda que houvesse muitas rainhas, o amado não envergaria o olhar para outra, ainda que houvesse muitos reis belos, sua amada nem de longe pensaria em esfriar, ainda que viessem as tentações e problemas não iriam buscar no corpo a solução, mas no sentimento da locução eu – tu estariam sempre se fundindo num nós, porque saberia que na ilusão do olhar mora a morte, porém na essência do outro, no prazer de estar com o outro, de enfrentar com alguém as barreiras e as delícias da vida estaria o verdadeiro prazer, impossibilitando quaisquer ricos de uma possível “rotina”. (Provérbios 16.25)
Deus por ser o próprio amor universal, deseja que seus filhos se embriaguem desse amor para descobrir outros amores que vida insere em nós. Ninguém pode se auto – satisfazer se antes não se banhar na fonte inesgotável do amor de Deus, ninguém se realizará por inteiro se dEle não descobrir tal coisa, ninguém conseguirá sair de suas fossas sentimentais se não compreender qual o propósito de se estar ali, ninguém deixará sua rotina de mesmices se não entregar primeiro sua alma ao Deus que promove mudanças no ser, se não deixar de bancar sozinho tais mudanças, ninguém escapará de tal situação se ainda acreditar que uma dose de química muda tudo.
Que você possa começar a ver o que muitos apenas olham, Oxalá que você reflita como deve ser sua escolha acaso você queira agradar a Deus, que você possa mudar de mentalidade e tomar água potável no poço das Sagradas Escrituras, que você reflita antes de escolher para que o seu casamento não seja apenas uma licença pra não pecar, mas uma benção por procurar nos recantos da cidade a alma de alguém, entender que essa alma pode estar visível se você não camuflá-la nas linhas externas e perigosas que um corpo pode oferecer. Sendo que, uma pele leitosa e macia, um olhar misterioso, corpos esculturais de uma cultura alienada, uma voz doce e quente, uma formação cultural invejável, uma posição econômica confortante, nada disso garantirá o fim ou o não começo de uma rotina se um e outro não buscar nas praças, ruas, na cama e nos recantos da casa uma alma cuja sede o saciará quando as crises os quiserem afogar.
“Um bilhete deixado no bolso da roupa, um tapinha no ombro, mãos na cintura ao passar, uma ligação repentina de saudade, passar as mãos nos cabelos, um elogio breve, um beijinho na face, são tantas formas de dizer eu te amo.”
Precisamos rever nossas formas de olhar pra ver o que não se percebe, “Eu dormia, mas o meu coração velava” (Cantares 5.2) Mesmo nesse estado de sono profundo que muitos se encontram é possível reverter o problema e mesmo com os olhos fechados, não pare de velar, vigiar, ficar atento aos embustes de tantas situações que nos deixam desarmados, mesmo dormindo esteja acordado para as possíveis reações do outro, para perceber que nas ações uma reação ressurge, ainda que triste e já desgastado, velar significa não lançar fora o que se conquistou, apenas juntar os pedaços de um possível recomeço sereno e paciente. Ainda que tentemos buscar fórmulas para refazer o sorriso, será inútil se com Deus não nos aconselharmos, inútil se acreditarmos que a rotina pode acabar se não compreendermos que estamos entrando em outra, inútil se ficarmos propensos a buscar água no mesmo poço sem água limpa: (filmes, revistas, objetos) por entender que estes meios não fortalecem, mas enfraquecem mais ainda ao longo da caminhada.
Vejamos todos onde estamos, busquemos no outro o ser dele e não o que as suas características podem oferecer, caso contrário continuaremos caminhar em círculo pelo deserto, entrando em rotinas diferentes achando que já saímos dela e quando nos dermos conta veremos que a solução que Deus nos dava estava tão ali bem perto, mas as murmurações e os passos infalsos de nossas vidas acabam por nos jogar numa estrada de quarenta ou mais anos sem entrar na terra prometida, a nossa felicidade.
Até a próxima!
André Silva.